Por Manuel Heitor
A mobilização de atores críticos na produção e difusão do conhecimento científico e tecnológico no âmbito da atual pandemia causada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, sobretudo no contexto da situação de crescente incerteza e alarme social em que vivemos, tem sido particularmente reveladora da rápida adaptação a um tempo excecional que nos impele a um maior sentido de dever cívico, de comprometimento com a saúde pública e com a segurança de todos, em particular dos mais idosos e vulneráveis.
O desafio é coletivo e exige a mobilização de todos, sobretudo para garantir medidas estruturantes e que venham a combater a pandemia, mas também estimular a economia e novas atividades de maior valor acrescentado.
Neste âmbito, para além dos desenvolvimentos em curso a nível internacional para novas terapias e vacinas, as quais têm ainda um percurso de aperfeiçoamento e certificação particularmente exigente em termos científicos e prolongado no tempo, as autoridades de saúde têm mostrado a necessidade de alargar o âmbito do rastreio e teste da população, em particular dos mais idosos e vulneráveis. Este processo exige a mobilização de recursos científicos e técnicos, designadamente com a perspetiva de alargar o âmbito de testes com base na extração de material genético do vírus (RNA), após a sua inativação e, a sua deteção por técnicas de amplificação dos ácidos nucleicos, pela reação de polimerase em cadeia (PCR) em tempo real, assim como para evoluir para novos testes com base em análises serológicas para a deteção de anticorpos em combinação com estudos imunológicos.
Adicionalmente a Organização Mundial de Saúde (OMS) estimou que 14% dos infetados com COVID-19 têm pneumonia e 5% ficam em estado crítico, necessitando de ventilação externa para conseguir respirar e combater a doença, tendo recomendado que os países obtivessem equipamentos ventiladores pulmonares para responder à epidemia.
Por outro lado, as exigências colocadas ao sistema de saúde, e aos seus profissionais, bem como a outros em situação de risco potencial, implicam necessidades de equipamentos de proteção individual e dispositivos médicos específicos, cuja escassez no mercado é conhecida.
Assim, diferentes iniciativas têm sido lançadas nas últimas semanas em Portugal para responder a estes desafios por parte de instituições cientificas e académicas, centros tecnológicos, empresas e estruturas públicas, incluindo entre outros:
- A mobilização de investigadores de instituições científicas e académicas e de empresas para o desenvolvimento de novas terapias e de vacinas em estreita colaboração internacional;
- O desenvolvimento de testes de diagnóstico, seguindo todas as orientações referentes ao manuseamento e análise de espécimes clínicos, designadamente com certificação pelo INSA e usando reagentes produzidos em Portugal, assim como permitindo estimar a carga viral, parâmetro que poderá ser relevante na avaliação do prognostico clínico;
- O desenvolvimento de sistemas de triagem, tendo por base uma identificação antecipada de pacientes com maior risco e permitido a deteção precoce da doença ainda antes do paciente ter marcados problemas respiratórios;
- O desenvolvimento, inédito em Portugal, de sistemas de ventilação e de ventiladores para suporte a pacientes com pneumonia aguda por COVID-19, em estreita colaboração com instituições médicas e a indústria, sendo de registar que se devem considerar três grupos distintos de projetos associados ao desenvolvimento de ventiladores, designadamente: i) Ventiladores invasivos de montagem simples e produção descentralizada, para ambiente hospitalar; ii) Ventiladores não invasivos adaptados apenas para eventual utilização como equipamentos de apoio; e iii) Ventiladores pandémicos, de relativa fácil execução, mas uso muito limitado;
- O desenvolvimento de Equipamentos de Proteção Individual, EPIs, em estreita articulação com centros tecnológicos e a indústria;
- Outros equipamentos e sistemas de apoio, concebidos e produzidos em várias instituições académicas e científicas em todo o País;
Deve ainda ser particularmente reconhecido o esforço de mobilização de muitas instituições de ensino superior e de ciência e tecnologia, sobretudo com atividades na área biomédica, em reunir e doar a hospitais e unidades de cuidados de saúde vários tipos de equipamentos e utensílios de apoio.
Portugal tem também apoiado as iniciativas a nível da Direção Geral de Investigação e Inovação (DG RTD) da Comissão Europeia que lançou uma linha de financiamento de 47,5 milhões de euros através do concurso “SC1-PHECORONAVIRUS-2020: Advancing knowledge for the clinical and public health response to the [COVID-19] epidemic”, cujos resultados já foram lançados, e no qual um dos projetos aprovados envolve o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) e a Direção Geral da Saúde (DGS).
Entretanto a Fundação para a Ciência e a Tecnologia, FCT, lançou duas novas linhas de financiamento em colaboração com a AICIB – Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica, designadamente:
- “RESEARCH 4 COVID 19”: para estimular a reorientação das atuais equipas de I&D a desenvolver projetos e iniciativas de investigação e desenvolvimento (I&D) que respondam às necessidades imediatas do Serviço Nacional de Saúde (SNS) no combate ao novo coronavírus, como novas ferramentas de prevenção, desenvolvimento terapêutico, métodos de diagnóstico, estudos clínicos e epidemiológicos, assim como atividades de I&D que incluam uma componente sociocultural e ações de promoção de uma sociedade resiliente com capacidade de enfrentar o atual contexto de incerteza em que vivemos, sobretudo na população mais idosa e em grupos de maior risco.
- “AI 4 COVID-19 – Ciência dos Dados e Inteligência Artificial na Administração Pública”: para apoiar projetos e atividades de investigação científica e desenvolvimento tecnológico que contribuam para combater a atual e futuras pandemias através da ciência dos dados e da inteligência artificial, desenvolvidos em parceria entre a administração pública e as instituições de I&D, com enfoque no apoio aos cidadãos e aos serviços e entidades prestadoras de cuidados de saúde, no âmbito da Iniciativa Nacional Competências Digitais e.2030 (Portugal INCoDe.2030).
Face à relevância das atividades em curso por muitos investigadores e técnicos em muitas instituições, públicas e privadas, para dar resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, assim como para alavancar novas atividades económicas de base tecnológica em Portugal, importa mobilizar investigadores e as suas instituições com a capacidade necessária para concretizar efetivamente os esforços em curso, assim como mobilizar outros institutos científicos e tecnológicos nacionais, empresas e técnicos de saúde para garantir a implementação efetiva das várias ações.
A ciência cura!
Mobilizemo-nos, Todos!
Manuel Heitor
Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior